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Autores e Obras

10/05/2014
 
ALBERTO GINASTERA (Buenos Aires, 1916 - Genebra, 1983)
Concerto para Violoncelo e Orquestra n° 1, op. 36
 
Compositor argentino mais reconhecido de todos os tempos, Ginastera começou a se destacar a partir de seu balé Panambi de 1937 e teve grande destaque com suas óperas Don Rodrigo, Bomarzo e Beatrix Cenci. Sua produção abrange ainda música de câmara e música vocal, balés, sinfonias, concertos e um grande número de peças para piano.
O próprio compositor dividiu sua obra em três períodos: no primeiro, que chamou de nacionalismo objetivo, compôs obras de temática folclórica, com influência de Stravinsky, Bartók e Falla; no segundo, nacionalismo subjetivo, os elementos tradicionais ainda são utilizados, mas de forma menos direta e mais simbólica; no terceiro, que chamou de neoexpressionismo, passa a utilizar técnicas mais radicais, como microtonalismo e música aleatória.
 
O Concerto para Violoncelo e Orquestra pertence a este último e foi comissionado em 1968 pelo Dartmouth College, New Hampshire. Revisou a obra e a reapresentou em 1978, quando sua esposa, Aurora Nátola-Ginastera, atuou como solista, sob a regência do violoncelista russo Mstislav Rotropovich à frente da National Symphony Orchestra.
Neste concerto Ginastera utiliza técnicas composicionais contemporâneas e se afasta da música tonal. Esses procedimentos dão à obra um caráter neoexpressionista de grande dramaticidade. Ao ouvir esta obra não se deve buscar melodias, pois elas não existem, ao menos no sentido tradicional. O que deve ser valorizado é a trama orquestral, a relação entre ela e o solista que nos conduz a um clima por vezes lúgubre, muito bem urdido pelo compositor. O violoncelo solista em vários momentos se contrapõe a isso, como se buscasse serenar a orquestra, num diálogo quase impossível.
 
A dramaticidade aparece já no primeiro movimento, Adagio molto appasionato, no qual toda a extensão do violoncelo é explorada. Aqui Ginastera faz uma referência histórica ao compositor Johann Sebastian Bach (1685-1750) quando utiliza o motivo B-A-C-H (que representa as notas si, lá, dó, si bemol).
O segundo movimento é indicado Presto sfumato; Trio notturnale. A palavra italiana sfumato indica coisas que se desfazem, evaporam. Também se refere a uma técnica de pintura do Renascimento na qual as linhas que delimitam as figuras são como que borradas pela mistura de uma cor a outra. Isto se reflete no solo do violoncelo, cujo tema, intenso e contínuo, não permite distinguir uma melodia, é tudo sfumato. A frenética atuação do violoncelo é envolvida por uma percussão hostil, com densas estocadas da orquestra. Esta agitação permanece até a parte central, na qual atuam somente trompa, harpa e violoncelo solista, que dialogam criando uma atmosfera que, se revela certa intimidade, é ainda assim bastante soturna. Há o retorno do intenso trecho inicial, mas agora com outro caráter determinado pela indicação il più pianíssimo possibile (o mais silencioso possível).
 
O último movimento, Assai mosso ed esaltato; Largo amoroso, tem duas seções distintas. Na primeira, que começa com a orquestra exaltada, o violoncelo, em geral solitário, se justapõe a ela, que conta com intensa participação da percussão. A segunda parte é reflexiva e transcendental e o violoncelo, contrastado com a orquestra ainda nervosa, porém mais contida, apresenta-se bastante introspectivo. Se na abertura do movimento a orquestra como que se arremessa aos ouvintes em acordes dissonantes, a conclusão é surpreendente, uma única nota do solista é desafiada pela orquestra e, após uma tentativa frustrada de diálogo, o violoncelo, solitário, se perde no silêncio.

 
 
PETER ILYICH TCHAIKOVSKY (Votkinsky, 1840 - São Petersburgo, 1893)
Sinfonia n° 5 em mi menor, op. 64.
 
A pouca confiança que Tchaikovsky tinha em seu talento está expressa em uma carta enviada ao irmão Modest em 1888, na qual comentava sobre uma crise de inspiração que acreditava ser insuperável. Havia passado as férias de verão trabalhando em uma nova sinfonia e estava convencido: sua criatividade estava desaparecendo. Escreveu também para sua protetora Nadezhda Von Meck: “Há algo repelente nisto... Esta sinfonia nunca agradará o público!”. O trabalho “repelente” era a Sinfonia n° 5, que estreou em São Petersburgo sob a sua regência em 1888 tornando-se uma das composições mais executadas de todos os tempos.
 
Tchaikovsky era um homem inseguro e frequentemente duvidava de suas habilidades, acreditava que sua música não tinha valor. Como um conto de fadas ao avesso, é um exemplo acabado do anti-herói, cuja música jamais teria sobrevivido se dependesse da sua própria avaliação.
Nesse sentido, o Andante Cantabile em Si bemol é exemplar: escrito como o segundo movimento do Quarteto de Cordas nº 1, estreou em Moscou no dia 28 de março de 1871, criou vida própria e foi um sucesso imediato. Baseado em uma canção popular, suscitou diversos arranjos, incluindo a versão para violoncelo e orquestra de cordas realizada pelo próprio compositor que, entretanto, se aborreceu com a repercussão da obra, que considerava de segunda classe. Mas durante um concerto, ao notar lágrimas na face do grande escritor Leon Tolstói, teve que repensar seu julgamento.
Apesar de Tchaikovsky não ter indicado um programa para a Sinfonia n° 5 afirma-se que ela descreve a batalha do homem contra o Destino, sendo este derrotado no final. Essa ideia estaria expressa em um caderno de notas onde aparentemente, mais que esboços para uma sinfonia sobre o Destino, Tchaikovsky estaria questionando seu próprio destino: “Introdução. Completa resignação diante do Destino, ou, o que é o mesmo, diante da predestinação inescrutável da Providência. Allegro, (1) Murmúrios, dúvidas, lamentos, censuras contra XXX. (2) Devo lançar-me aos braços da fé???
 
Os quatro movimentos da Quinta Sinfonia são unificados através de uma referência comum a um tema anunciado pelas clarinetas em tom sombrio logo no início da obra. Alguns estudiosos afirmam que aqui estaria representada o Destino que Tchaikovsky havia se referido em escritos anteriores. O tema é recorrente em toda a sinfonia e aparece retrabalhado algumas vezes. Ele explode abruptamente no trecho que antecede o final do segundo movimento, Andante cantabile con alcuna licenza. Este se inicia com um solo de trompa trágico, porém lírico, até que um segundo momento é introduzido pelo oboé e depois desenvolvido pela orquestra. O terceiro movimento, Allegro moderato, é uma valsa e aqui o tema do Destino é citado por clarineta e fagote próximo ao final. No último movimento, Andante maestoso, o motivo sombrio do Destino aparece transposto do modo menor para maior, o que dá um caráter triunfal ao final da obra, indicando a vitória final sobre o Destino. Mas essa euforia seria temporária, já que na Sexta Sinfonia, que estreou no ano seguinte, poucos meses antes da morte do compositor, o que se sobressai é um Tchaikovsky totalmente sucumbido e derrotado pelo Destino.

 

 
Lenita W. M. Nogueira


 


 

 

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