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Gravações campineiras

28/09/2018

por  Jorge Coli 27/09/2018

Recebo dois discos preciosos da Orquestra Sinfônica de Campinas. Um deles reúne os Três concertos cariocas de Radamés Gnattali. É uma primeira gravação, realizada em 2016.

Sempre tive para mim que a fusão entre a música dita clássica e a dita popular, se não é impossível, é muito difícil. Quando um compositor quer dar uma cor local, regional, nacional a uma obra, quando quer se renovar, inspirando-se nas expressões folclóricas, ou na produção da canções populares, ele empresta temas, características rítmicas, singularidades harmônicas ou polifônicas, e transporta isso para o mundo sinfônico, ou da ópera, ou de câmara. As novidades estão lá, mas deixaram seu espírito popular, que é baseado na interpretação instintiva. Viraram música de concerto.

Não sei de outro compositor que tenha conseguido, com tanto desembaraço, situar-se comodamente na fronteira entre esses dois gêneros, além de Radamés Gnattali. Os Concertos cariocas são a prova dessa maravilhosa fusão. O atual CD tem os seguintes solistas: Rafael dos Santos, no piano, Eduardo Lobo na guitarra, Danilo Penteado no contrabaixo, Lucas Casacio na bateria, Hercules Gomes, no piano, Guilherme Ribeiro, no acordeão, e o Grupo Quatro a Zero. A eles se juntou a Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas regida por Victor Hugo Toro.

Mais do que um emprego estratégico ou de uma citação, mais do que uma absorção pela música escrita, essas obras trazem um “espírito” que é um misto dos dois termos. Tudo é inspiração, leveza musical, felicidade da escuta. Se a gravação é primeira e única, ela se afirma já como uma referência.

Gnattali não se importa com etiquetas: passa do jazz à música de cinema, do rigor escrito à improvisação, refletindo aquilo que ele próprio era: um músico que amava a complexidade da música clássica e a vivacidade da música popular, transitando facilmente, com naturalidade elegante, por esses dois universos. Os Três concertos cariocas, concebidos com tanta ligeireza e tanta finura, são obras que encantam a alma. Devem ser degustados sem moderação.

 Victor Hugo Toro [Divulgação]

Victor Hugo Toro [Divulgação]

Outro disco, também de 2016, intitula-se Carlos Gomes, árias e canções. Carlos Gomes foi o grande gênio campineiro. No entanto, afora dar nome a praça, posar com sua juba num monumento de bronze – e também ter o título de uma de suas óperas servindo de nome para um dos principais times de futebol da cidade (e quantos torcedores sabem disso?) – é fato que, salvo exceções abnegadas, Campinas nunca fez muito por ele e por sua obra.

Razão a mais para saudar com entusiasmo esse disco que apresenta, com alta qualidade musical, árias de suas óperas e algumas de suas encantadoras canzoni da salotto.

Duas excelentes sopranos brasileiras, Carla Domingues e Jayana Paiva, encarnam as heroínas que ele criou musicalmente: Cecilia, Delia, Gennariello, Ilara, Adin e Isabella. Os diferentes climas dramáticos emergem, muito convincentes, num espectro de emoções diversas. Belas e límpidas vozes, que são acompanhadas pela Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas em grande forma, sob a direção de Victor Hugo Toro.

As mesmas cantoras, tendo ao piano Elisande Camondá Pereira, interpretam as canções, que vão de Quem sabe, Conselhos, e Suspiros d’alma, em português, a La regata, Civettuola, Rondinella, em italiano, e a Mon bonheur, Noces d’argent, em francês. Pequenas e brilhantes joias.

É uma bela iniciativa. Esperemos que não pare aqui, e que tenhamos, gravadas com a mesma alta qualidade, óperas completas: o Brasil, e sobretudo Campinas e os campineiros, precisam abraçar a causa da divulgação e do estudo que merecem as partituras desse grande gênio.

fonte: www.concerto.com.br

 

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