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03.10.2008
15 e 16 de março: As Obras

JOSEPH HAYDN (Rohrau, 1732-Viena, 1809)

Música Instrumental sobre as Sete Últimas Palavras de Cristo

 

O primeiro emprego importante de Haydn foi o posto de mestre-de-capela na corte do Conde Morzin a partir de 1757. Com a derrocada financeira do conde, perdeu o cargo e em 1761 conseguiu ser nomeado mestre-de-capela assistente na casa da família Esterházy, uma das mais ricas e influentes do império austríaco.  Cinco anos depois foi nomeado mestre de capela e por mais de trinta anos ali permaneceu. A despeito de seu isolamento da vida musical mais movimentada de Viena e Paris e da atividade profissional incessante, Haydn concluiu neste período obras importantes para o desenvolvimento da história da música, já que tinha total liberdade para compor e pôde explorar a escrita musical com profundidade.  

Em 1786, já no fim de seu período com a família Esterházy, Haydn recebeu uma encomenda do bispo de Cádiz, na Espanha, para que escrevesse uma peça orquestral baseada nas Sete Últimas Palavras de Cristo a ser executada durante a Quaresma, uma espécie de reflexão comentada sobre a Paixão e Morte de Jesus Cristo. É interessante notar que a solicitação foi de uma obra instrumental, na qual o texto é apenas sugerido, procedimento que vai contra os cânones da música sacra, que, desde seus primórdios, nunca prescindiu das palavras para se expressar.

Muitos anos depois da estréia, Haydn recordava-se em carta ao amigo G. A. Griesinger que era tradicional a apresentação de um oratório na Igreja de Cádiz, mas desta vez o bispo havia solicitado uma peça instrumental. Quando sua obra foi apresentada, as paredes, janelas e colunas da igreja foram recobertas com pano negro, gerando uma escuridão que somente era quebrada por luzes colocadas ao centro. Ao meio-dia as portas foram fechadas e a cerimônia começou com uma pregação do bispo, que subiu ao púlpito e pronunciou a primeira das sete palavras. Assim que terminou, deixou o púlpito e caiu de joelhos frente ao altar e durante esse intervalo a igreja foi tomada pela música. O mesmo foi feito com as outras palavras, a orquestra seguindo a conclusão de cada discurso. Haydn teve que se sujeitar a essas condições pré-estabelecidas e comentou que foi bastante penoso compor sete adágios de dez minutos, que deveriam suceder-se uns aos outros sem cansar os ouvintes.

Da escrita original Haydn acrescentou a Introduzione e o Terremoto no final, de acordo com Matheus 28:2. A peça é consolatória e meditativa, mas no último movimento introduz um elemento diferente que Haydn indicou “Presto e con tutta la forza”, fechando a obra com intensidade rara em sua obra. Entre 1795 e 96 Haydn arranjou esta obra para vozes com texto em alemão, para cravo e também para quarteto de cordas. Entretanto, há duvidas sobre a autoria desse quarteto devido à transcrição considerada pouco cuidadosa, já que passagens importantes foram deixadas de fora.  

 

JOHANN SEBASTIAN BACH  (Eisenach, 1685-Leipzig, 1750)

Christ lag in Todesbanden, BWV 4 da Cantata de Páscoa (arranjo para orquestra de Leopold Stokowski)

 

Bach provavelmente escreveu a cantata Christ lag in Todesbanden (Cristo estava nos braços da morte) para a Páscoa de 1707, tomando como base um coral do mesmo nome composto por Martinho Lutero. Escrita originalmente para coro misto (soprano, contralto, tenor e baixo), dois violinos, duas violas e baixo contínuo e dividida em oito partes, sendo esta a segunda, após a Sinfonia.

Trata-se de uma peça de juventude, quando Bach, ainda estudante, havia se transferido para a cidade de Mülhausen, onde a teria composto. Anos depois, ao mudar-se para Leipzig, teria feito modificações substanciais na obra, inclusive acrescentando novos instrumentos, e não se sabe o quanto resta da música original na versão executada atualmente. Em Leipzig a peça foi apresentada em 1724 e 1725. 

O arranjo é do maestro Leopold Stokowski (Londres, 1882-1977), conhecido por sua atuação nos Estados Unidos, onde popularizou a música erudita, principalmente à frente da Orquestra da Filadélfia, que conduziu por mais de 25 anos, transformando este conjunto  em uma das mais importantes orquestras do mundo. Introduziu aos ouvintes americanos peças até então desconhecidas como a 8ª. Sinfonia de Mahler, A Sagração da Primavera de Strawinsky, Gurrelieder de Schoenberg, Wozzeck de Alban Berg e obras de Richard Straus, Rachmaninof, Sibelius, Shostakovitch, Falla, Prokofief e compositores americanos.

No final de 1930 deixou a Filadélfia para formar a All-American Youth Orchestra e para dirigir, ao lado de Toscanini, a lendária orquestra da NBC. Mais tarde tornou-se regente da New York Philarmonic. Entre 1955 e 1961 foi diretor musical da Houston Simphony Orchestra e em 1962 fundou a American Simphony Orchestra. Bastante preocupado com a popularização da música erudita, participou de diversos filmes, em especial Fantasia de Walt Disney em 1940 e realizou diversas transcrições de peças para orquestra, incluindo diversas obras de Bach, Haendel, Mussorgsky e Shostakovitch, além de compositores menos conhecidos do grande público como Palestrina e Gabrieli. Retornou à Inglaterra em 1972, onde continuou a difundir a música orquestral, vindo a falecer ali em 1977.

 

HARRY CROWL (Belo Horizonte, 1958)

Sicut erat in principio

 

Músico mineiro que hoje vive em Curitiba, Harry Crowl escreveu esta peça em 1999 e seu tema básico é a criação do mundo. A seguir transcrevemos texto de sua autoria no qual descreve a obra:

“Dividida em quatro momentos que são executados sem interrupção, esta obra é como um ensaio sobre a criação, onde cada uma das partes é alusiva a um dos momentos da existência mítica do mundo. No início era o vazio, seguido do caos, com fogo, cometas e meteoros. Em seguida, o homem, já dono mundo, começa a organizar as coisas conforme as suas necessidades. Na terceira parte, há a contemplação da natureza onde ela é ainda intocada: - nos sonhos. Finalmente, fazendo parte de um universo que se torna cada vez maior e mais complexo do ponto de vista do homem, o mundo segue o seu curso rumo ao desconhecido. Esta visão, que não privilegia qualquer leitura religiosa, mas ao mesmo tempo está presente em todas as crenças, dialoga com duas obras clássicas, ou seja, do século XVIII, o motete para sexta-feira da paixão “Miserere”, de Manuel Dias de Oliveira (MG, 1735-1813) e o oratório “Die Schöpfung” (A Criação), de F. J. Haydn. Do primeiro, quatro compassos, que aparecem em forma de coral nos sopros em constante transformação, foram citados da referida obra. Do mestre austríaco, a idéia de uma escala tocada pela clarineta representando um cometa nos primeiros momentos da criação é aproveitada e expandida na segunda parte da obra. A obra termina em um acorde dissonante como uma grande pergunta: - Para onde vamos?”

Esta peça é uma reelaboração de Sicut, peça para orquestra de câmara escrita em 1989, que estreou em outubro de 1992 durante o 14º Panorama da Música Brasileira Atual na Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

 

NICOLAI RIMSKY-KORSAKOV (São Petersburgo, 1844-Lyubensk, 1908)

Abertura A grande Páscoa Russa, op. 36

Rimsky-Korsakov, como muitos compositores do século XIX, começou como amador. Embora sua família fosse de músicos, seguiu a carreira de oficial da Marinha, mas aos 27 anos foi convidado para professor de composição do Conservatório de São Petersburgo. É autor de um dos mais importantes tratados de orquestração, utilizado até hoje.

A grande Páscoa Russa, baseada em temas da tradição musical da Igreja Ortodoxa Russa, foi escrita em 1868 e fechou a trilogia formada por Capriccio espagnol e Scheherazade, que, segundo Korsakov, “marcou o fim do período em que a minha orquestração atinge certo grau de virtuosismo e de sonoridade sem influência wagneriana [de Richard Wagner] e dentro dos limites da composição da orquestra comum de Glinka.” Um ponto em comum entre A grande Páscoa Russa e Scheherezade é a utilização de cadenzas de violino que separam algumas das seções.

Rimsky-Korsakov, em sua autobiografia, deixou claro o que queria expressar em sua música “o lado legendário e pagão do feriado de Sábado, esta transição da noite escura e misteriosa da Paixão para a desenfreada festividade pagã-religiosa da manhã do Domingo de Páscoa. “

A peça foi dedicada a Modest Mussorgsky e Alexander Borodin, dois compositores russos que, ao lado de Korsakov, Balakirev e Cui, formaram o chamado Grupo dos Cinco, que, sob inspiração de Mikhail Glinka, tinha por objetivo preservar a música russa da influência da música italiana e alemã.

No decorrer da Grande Páscoa Russa existem diversas citações bíblicas, em especial do sexagésimo sétimo salmo e da cena da Ressurreição (que aparece no final), conforme contado por São Marcos. Estas citações foram assinaladas pelo compositor na partitura de forma a guiar o intérprete e o ouvinte.

A parte inicial da peça se divide em dois temas: começa com um tema eclesiástico de bastante solenidade, baseado em um antigo cântico ortodoxo russo. Este tema reaparece diversas vezes durante o decorrer da obra, com diversas formações e variantes. Um solo de violino conduz ao segundo tema, primeiramente executado pelo violoncelo solista acompanhado de harpa, violino solo e flautas. Um trecho da flauta antecede a repetição do tema, agora apresentado pelos trombones, sugerindo as vozes possantes dos sacerdotes dentro da igreja. Após várias referências aos dois temas, conclui-se o que pode ser considerado a primeira parte da obra.

Segue-se um tema bastante vivo e sincopado, que conduz a peça a um momento de grande exaltação até que uma melodia mais calma é introduzida, um canto conhecido como obikhod, que tem o texto “Cristo se levantou”. A Abertura chega a seu climax e o obikhod reaparece “entre as explosões de trompete e ressoar de sinos, constituindo uma coda triunfante.”

A parte final desta abertura é grandiosa e nela encontramos o Resurrexit, onde, segundo o compositor, estão representados “o coro de anjos no céu ao som das trombetas dos arcanjos e a vibração das asas do serafim” e “os cantos dos sacerdotes nos templos em meio a uma nuvem de incenso, à luz de inumeráveis velas sob o repicar de sinos triunfantes.”


DICIONÁRIO MUSICAL

 

ABERTURA. Um movimento introdutório para orquestra cujo objetivo é introduzir uma ópera, oratório ou outra composição vocal, apresentando os temas que serão ouvidos durante peça. Também pode ser, como é o caso aqui, uma composição independente e neste caso é chamada abertura de concerto.

ADAGIO. Um andamento lento.

CANTATA. Um poema colocado em música para ser executado por vozes e instrumentos, que em geral tem vários movimentos: arias, recitativos e coros. 

GLINKA, Mikhail Ivanovich (1804-1857). Primeiro compositor russo a ser reconhecido fora de seu país e considerado como o pai da música russa. Teve grande influência sobre compositores russos, notadamente os nacionalistas ligados ao Grupo dos Cinco (Mily Balakirev, Alexander Borodin, César Cui,  Modest Mussorgsky e Nicolai Rimsky-Korsakov)

WAGNER, Richard (1813-1883). Compositor alemão, teórico e ensaísta, mais conhecido por seus “dramas musicais”, nos quais buscava a Gesamtkunstverk, ou obra de arte total. Influenciou diversos compositores principalmente pela sua escrita contrapontual, cromatismo, harmonias e orquestração, trazendo muitos avanços para a linguagem musical, que influenciaram muitos compositores europeus.

 

Lenita W. M. Nogueira




 
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